Boa Ventura! (Lucas Figueiredo)

Algumas pessoas costumam torcer o nariz quando assunto é História, mais especificamente História do Brasil. Talvez tenha alguma coisa a ver com o processo que na escola transforma futuros leitores em odiadores de Literatura (e Literatura Nacional), mas a realidade é que para muita gente passar no vestibular significa, entre tantas coisas, tirar o peso de “coisas chatas” como essa. E aí que pessoas assim acabam perdendo livros excelentes como Boa Ventura! de Lucas Figueiredo, que já no subtítulo deixa claro sobre do que se trata: A corrida do ouro no Brasil (1697-1810) – A cobiça que forjou um país, sustentou Portugal e inflamou o mundo.

O que de fato é uma pena. O trabalho de investigação que Figueiredo entrega ao leitor é delicioso, repleto de curiosidades mas, o mais importante, muito bem alinhavado. Não é romance (acredito ser algo que se enquadraria em “Jornalismo Histórico”), mas dada a fluidez e coesão do texto, e mais ainda, a galeria de personagens que passam pela obra, poderia muito bem ser lido como tal.

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Rushmore

Aparentemente eu estou em uma fase “filmes que ganharam títulos ridiculamente bizarros”, não sei. Primeiro foi Heathers (Atração Mortal). Agora vou lá no IMDb ver qual é o nome aqui no Brasil para Rushmore e pans, TRÊS É DEMAIS. Aposto que a tradução foi feita a partir da sinopse e que essa tinha aquele tom de narração de Sessão da Tarde ou qualquer coisa do tipo, porque não consigo pensar em título mais equivocado para o filme do que esse. Aliás, que fosse “Rushmore – Inclua aqui um subtítulo tosco”, já faria mais sentido.

Eu reclamo dessas traduções ruins porque elas podem fazer com que um filme que até tenha potencial fracasse miseravelmente aqui no Brasil, sendo completamente ignorado por conta de um título estúpido. Veja lá o caso de The Fall, lindíssimo, que virou Dublê de Anjo. Nem eu perderia minutos preciosos da minha vidinha para assistir a um filme com esse nome. E acho que o mesmo acaba valendo para Rushmore.

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Supernatural S06E19 e S06E20

Então que eu gostei muito do episódio 19 (Mommy Dearest) desta sexta temporada, mas eu estou tão, mas tão desconfiada do trabalho dos roteiristas de Supernatural que eu tenho certeza que se eu decidisse rever os episódios eu veria um monte de buracos nas explicações que eles arrumaram para amarrar todo o monte de gororoba que acabaram colocando nesta temporada (Crowley, os alfas, a Eve, a guerra no céu, etc.). Minha memória é ruim e por enquanto não consigo achar nada, então por enquanto posso me considerar satisfeita com a tal da amarração.

O que ficamos sabendo é que a Eve está voltando com força total, colocando um monte de cria para tocar o horror porque hum, Crowley está judiando as crianças dela (os alfas estavam sendo torturados para dizer para o demônio onde ficava o purgatório, leeeembra?). Aí Dean fala o que nós também falaríamos, ei moça, você tá atrasada, o Cass fez churrasquinho dele tem uns episódios já. E tchanaaaaaam, grande surpresa, ele está vivo. Sério, para mim foi surpresa mesmo, depois que Cass queimou os ossos dele eu só pensei “Poutz, mataram a personagem mais legal que apareceu recentemente!” e buenas, vamos continuar assistindo ao show.

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O Longo Adeus (Raymond Chandler)

Feche os olhos e pense em um detetive particular dos filmes e livros noir. Pensou? Provavelmente o que veio na sua mente foi aquele sujeito meio cínico, de atitudes violentas quando necessárias, senso de humor corrosivo e cujo visual assemelha-se muito com Humphrey Bogart usando chapéu e capote, e sempre com um cigarro por perto, como dá para ver nessa imagem aqui:

Isso não acontece à toa. Muito do que se lê/vê de noir teve fortíssima influência de Raymond Chandler (1888-1959), que nos tempos do pós-Guerra e pós-Depressão escreveu várias histórias com uma personagem que viraria modelo de detetive particular, Philip Marlowe. E é lendo obras como O longo adeus (publicada originalmente em 1954) que dá para ter uma ideia de porque a personagem ficou tão famosa e, mais do que isso, porque é tão imitada.

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Para ler o livro ilustrado (Sophie Van der Linden)

Carregado do preconceito de “coisa para criança”, o livro ilustrado (ou picture book em inglês) parece render pouca discussão e até mesmo merecer pouca atenção do público mais velho. Mas fica a ênfase para a palavra “parece”, como mostra Sophie Van der Linden em seu excelente Para ler o livro ilustrado (publicado no Brasil recentemente pela Cosac Naify). Através de uma pesquisa bastante aprofundada ela nos mostra que de simplório esses livros não têm nada, e possuem mecanismos próprios e complexos, no que vem a ser uma combinação do texto com a imagem.

Como a autora mostra ao longo do seu estudo, o livro ilustrado evoluiu muito desde as primeiras versões em xilogravura do século XVIII até os dias de hoje. Os artistas exploram cada vez mais a infinidade de possibilidades do casamento entre a escrita e a ilustração, indo muito além de um simples contar história. Ele chama o leitor para dentro dela, faz com que ele participe, faça parte daquilo. O livro vem como uma máquina cujo motor é o leitor.

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Luka e o Fogo da Vida (Salman Rushdie)

Vinte anos após a publicação de Haroun e o Mar de Histórias, Salman Rushdie publica o que seria uma continuação desse primeiro livro, Luka e o Fogo da Vida. De fato, personagens do primeiro livro reaparecem, mas como o foco desta vez é o caçula do contador de histórias Rashid Khalifa, o que temos é uma obra que pode ser lida de forma independente sem apresentar qualquer dificuldade de compreensão.

Luka e o Fogo da Vida foi escrito para o filho mais novo de Rushdie, e assim voltado para o público infantojuvenil. Mas é o típico caso de livro escrito para um público mas que pode agradar todo tipo de leitor, porque resgata não só a magia de histórias já conhecidas (sejam de mitologias milenares, seja do imaginário da cultura pop), mas também a estrutura básica dos contos populares, dando aquela sensação de familiaridade com o texto que permite para quem o lê simplesmente se deixar levar pela história, seduzido página após página pelo mundo encantado criado por Rushdie.

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Hora de Voltar

E eu continuo com meus critérios altamente bizarros para escolher um filme. Desta vez assisti Hora de Voltar (Garden State) porque tinha “o carinha do Scrubs” no papel principal e porque há anos (literalmente!) via essa imagem aqui:

E queria entender o contexto. Ótimos critérios para pular a fila enorme de filmes para se assistir, ahn? Porém desta vez eu dei sorte (ao contrário do que aconteceu com Heathers) e gostei muito de Hora de Voltar. Não é daquelas histórias que mudarão sua vida, mas ao mesmo tempo são tão encantadoras que você vai até o fim e pensa, puxa, que legal que tive a chance de assistir.

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Balanço Literário do Mês: Abril

Há quem diga que o melhor jeito de começar a odiar literatura é cursar Letras. Se isso é verdade, então eu posso dizer que dei sorte, acabei conhecendo professores que me apresentaram gente que ainda não conhecia, e criaram em mim paixão e respeito por outros que já conhecia, mas pensava não gostar. Porém, não vou negar que há algo bastante chato sobre o curso, especialmente se seu bacharelado é em Estudos Literários como foi o meu. Vai soar estranho o que direi, mas a parte chata é que você lê muito.

“Está louca? Isso é exatamente meu sonho!”. Pois sim, meu pequeno gafanhoto, era o meu também quando optei por esse curso e esta habilitação. A questão é que são leituras obrigatórias. E mesmo que dentre dessas obrigatórias eu quase sempre tivesse um prazer enorme em ler, ainda assim elas continuavam com esse status de… hum, obrigatórias. E aí eu lia muito, muito mesmo. Mas do que eu queria mesmo, era nada, porque quando chegavam as férias era óbvio que eu queria mais é descansar.

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Supernatural S06E17e S06E18

É, quando eles chutam o balde e deixam para lá a linha principal da narrativa, Supernatural volta a ficar bacana. Lembra um pouco aquela fórmula de monstro do dia das primeiras temporadas, há de volta aquele equilíbrio entre o horror e humor e quando o episódio termina você não pensa que foi tempo jogado fora, por mais que tenha torcido o nariz para alguma coisa ou outra. É o caso de My Heart Will Go On (S06E17), que apesar do plot sem pé nem cabeça até que foi bem divertido.

Dean e Sam estão em uma outra linha do tempo, na qual Balthazar impediu que o Titanic afundasse (segundo ele porque não suportava o filme, mas depois ficamos sabendo dos reais motivos, mas ok, valeu a piada). Nessa linha do tempo Bobby é casado com a Ellen, que antes que alguém estranhe e ache que é um lance de necrofilia, não, não está morta.

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Oriente, Ocidente (Salman Rushdie)

A crítica literária sempre debate sobre o real peso da biografia de um autor na compreensão de sua obra, debate esse marcado por dois extremos: os que acham que é perigoso interpretar um texto considerando a vida do autor, e os que acham que é simplesmente fundamental. De minha parte continuo achando que o ideal é o meio termo, antes de tudo saber identificar quando dados biográficos realmente vão de encontro ao texto, podendo ser então utilizados para o estudo da obra.

No caso de Salman Rushdie, escritor nascido em Mumbai na Índia, mas que ainda jovem foi estudar na Inglaterra, acredito que deixar de lado sua biografia chega quase a ser um pecado, ainda mais no caso de Oriente, Ocidente, coletânea de contos publicada originalmente em 1994 e que agora a Companhia das Letras lança em formato de bolso através do selo Companhia de Bolso. O título mostra de bastante óbvia o que veremos nas (poucas!) 168 páginas do livro: mundos aparentemente tão diferentes se mesclam, criando uma literatura sem pátria, sem fronteiras – tal e qual acontece com pessoas como Rushdie, nascidas em um lugar mas que passaram a viver muito tempo de vida em outro.

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