Para ler o livro ilustrado (Sophie Van der Linden)

Carregado do preconceito de “coisa para criança”, o livro ilustrado (ou picture book em inglês) parece render pouca discussão e até mesmo merecer pouca atenção do público mais velho. Mas fica a ênfase para a palavra “parece”, como mostra Sophie Van der Linden em seu excelente Para ler o livro ilustrado (publicado no Brasil recentemente pela Cosac Naify). Através de uma pesquisa bastante aprofundada ela nos mostra que de simplório esses livros não têm nada, e possuem mecanismos próprios e complexos, no que vem a ser uma combinação do texto com a imagem.

Como a autora mostra ao longo do seu estudo, o livro ilustrado evoluiu muito desde as primeiras versões em xilogravura do século XVIII até os dias de hoje. Os artistas exploram cada vez mais a infinidade de possibilidades do casamento entre a escrita e a ilustração, indo muito além de um simples contar história. Ele chama o leitor para dentro dela, faz com que ele participe, faça parte daquilo. O livro vem como uma máquina cujo motor é o leitor.

A obra de Van der Linden aborda todas essas facetas do livro ilustrado de forma organizada e bastante clara, acessível até mesmo para quem não é iniciado em nenhum dos campos abordados no estudo. Começa descrevendo a evolução desse tipo de livro, para então tentar buscar uma definição mais precisa sobre do que se trata. Preparado o terreno para o leitor, é chegada a hora de aprofundar na arte em si, nos capítulos que abordam páginas e espaços do livro e as que comentam a relação textos e imagens.

O que vale ressaltar é que mais do que a linguagem que foge do pedantismo típico acadêmico, soando bastante agradável e interessante, o texto de Van der Linden também vem repleto de curiosidades que chamam a atenção daqueles que gostam de livros. Como por exemplo o termo francês para aquela “tomada de ar” que alguém dá enquanto lê uma história (unités de souflle, unidades de fôlego) ou mesmo a explicação sobre técnicas de ilustração e de produção da imagem.

É um estudo minuncioso, que fica ainda mais completo com as quase 600 imagens que ilustram todo o livro, funcionando como exemplos do que a autora está comentando (e também como alerta de como poucos dos livros ilustrados franceses ganharam tradução no Brasil). Junto ainda há diversos artigos de outros autores que complementam o que Van der Linden está explicando (esses artigos aparecem em cor cinza, se destacando do restante do conteúdo). É muito material, para ser absorvido aos poucos, porque o que vemos em Para ler o livro ilustrado em muitos momentos requer uma reflexão do nosso papel como leitores, e de como a literatura e a arte é feita pensando em nós.

Livro fundamental para quem se interessa minimamente sobre literatura, até porque abre novos caminhos para um assunto que não ganhou ainda o espaço merecido nos estudos literários, talvez por ser meio ilustração, meio texto. Mas não se engane, porque não é uma obra que soa à leitura obrigatória pedida pelo professor para uma prova. É delicioso, e agradará em cheio quem não só gosta de ler livros, mas também gosta de saber mais sobre eles.

Um comentário em “Para ler o livro ilustrado (Sophie Van der Linden)”

  1. Pois é…a França tem uma tradição em ilustrações em geral, de dar gosto… meu sonho é vê-los traduzidos por aqui. Bela resenha…

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