O Clube do Suicídio e outras histórias (Robert Louis Stevenson)

Robert Louis Stevenson nasceu em Edimburgo, em 1850. Caso tivesse feito o gosto do pai, seria engenheiro, e não um dos melhores contadores de história da Grã-Bretanha. Stevenson viajou o mundo e transpôs muito do que viu para seus trabalhos, como por exemplo A Ilha do Tesouro – trazendo relatos que são diversão garantida para quem lê, e talvez até por isso mesmo já tenha sido uma “celebridade” ainda em vida, o que lhe garantiu a segurança para ter a escrita como profissão, e o que em consequência nos trouxe histórias inesquecíveis, que continuam agradando ao leitor mesmo tantos anos após a publicação original.

E isto fica evidente ao ler O Clube do Suicídio e outras histórias, que chegou este mês através da coleção Prosa do Mundo da Cosac Naify. O livro tem duas novelas e quatro contos que retratam de forma exemplar a produção do autor, além disso traz introdução de Davi Arrigucci Jr. e também no Apêndice dois textos interessantíssimos para quem gostou do que pode conferir nessa coletânea: Robert Louis Stevenson por Henry James e O estranho caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde por Vladimir Nabokov.

O livro abre com a novela O Clube do Suicídio, uma aventura que em muito lembra os bons momentos de outro escocês, Sir Arthur Conan Doyle e seu Sherlock Holmes. Em uma trama envolvendo crime e muita astúcia num jogo de gato e rato entre o príncipe Florizel da Boêmia e o presidente do Clube do Suicídio. São três capítulos que brincam principalmente com a curiosidade do leitor sobre o destino das personagens, que são muito interessantes e acredito se encaixarem muito bem na imagem que se fazia dos “gentlemen” do período vitoriano.

Fica inclusive o reconhecimento pela Cosac trazer esta novela que não era tão conhecida aqui no Brasil, e colocá-la em destaque na coletânea, que por conta com O estranho caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde (também conhecida como O Médico e o Monstro), novela genial do autor mas que já é amplamente conhecida do público. O retrato da dualidade do ser humano, misturado com uma atmosfera de terror muito bem desenvolvida mostra bem porque esse texto sobreviveu ao longo dos anos. Tamanha a força da obra que mesmo quem nunca teve o livro em mãos sabe do que se trata a referência de ser “o médico e o monstro”.

Assim, tomando a coletânea como uma representação das publicações de Stevenson, O estranho caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde é um título fundamental, e também imperdível. Porque além de levantar a já comentada questão sobre o que é o mal e de como não existe uma pessoa que tenha dentro de si apenas a bondade, ele também é mais um daqueles casos que mostram como Stevenson era um excelente contador de histórias, prendendo a atenção do leitor do começo ao fim.

O mesmo se dá obviamente com os contos, nos quais o elemento fantástico sempre marca presença, mesmo que em alguns casos apenas de modo sutil. Markheim traz novamente o tema do que é o mal, mas aqui sob a ótica da culpa, e com um desfecho muito empolgante que provavelmente deixará o leitor com um ponto de interrogação na testa. O engraçado é que se considerar o início desse conto, quase não dá para acreditar no trabalho de desenvolvimento de Stevenson, que chega na conclusão como algo completamente inesperado.

O conto a seguir, O demônio da garrafa, é um dos meus favoritos. O próprio autor já deixa claro que essa história não é nenhuma novidade, que ele está apenas recontando algo para o público polinésio para, segundo Stevenson, “despertar, perto de casa, algum interesse por aquilo que vem de fora”. Alguns detalhes se repetem bastante no conto, mas isso porque parte da ação consiste na obrigação da personagem de se livrar da garrafa com o demônio, que lhe garantiria desejos mas acaso ele morresse com o objeto em mãos, iria direto para o Inferno. Para passar adiante a garrafa seria necessário vendê-la por um valor menor do que a que foi comprada – agora pense em anos de existência da garrafa, e o perigoso valor pelo qual o protagonista a adquire inicialmente.

O ladrão de cadáveres é terror puro, e tem sua raiz em uma história real, a de Burke e Hare, que roubavam corpos em cemitérios para levar para a escola de medicina, e algum tempo depois passaram a matar pessoas para “garantir o estoque”, digamos assim. Aqui vemos um estudante que primeiro tem como tarefa receber os corpos para as aulas de anatomia, fazendo vista grossa para o que obviamente passaram a ser assassinatos. Até que chega o momento em que ele precisa ir atrás de um corpo… É, volto a insistir, delicioso de ler porque a prosa de Stevenson consegue prender o leitor, realmente o envolver na atmosfera da história.

O último conto é o mais curto e também o mais fraco (embora seja importante destacar que não é ruim, só não é tão bom quanto os demais), O vestíbulo. Aqui temos uma narrativa de crime, embora o desfecho não deixa claro se realmente o foi, em uma espécie de brincadeira com o leitor. De qualquer forma, não é tão empolgante quanto os demais.

Mesmo com um desfecho um pouco mais fraco, a verdade é que a coletânea é excelente. Como acontece em livros assim, é uma boa sugestão para quem está querendo conhecer um pouco do autor. Mas é também uma ótima pedida para todos aqueles que querem se divertir com qualidade de uma prosa muito bem desenvolvida, coisa que Stevenson faz muito bem em todas as páginas desse livro.

3 comentários em “O Clube do Suicídio e outras histórias (Robert Louis Stevenson)”

  1. acho essa coleção muito interessante, tem um acabamento caprichado, mas acho que nada justifica o preço que estão cobrando. Aliás, cada ida à livraria, fico mais surpreso com os preços.

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