Liberal Arts

liberalartsJesse (Ted Mosby Josh Radnor) está ali na casa dos trinta e poucos, aquele momento em que os sonhos da adolescência deveriam estar se concretizando, mas a realidade mostra que não é algo assim tão fácil. Seu diploma em língua inglesa não lhe rendeu o futuro cheio de conversas com pessoas que amassem os livros como ele, não há nem sinal de um relacionamento estável em sua vida (pelo contrário, acabou de tomar um fora) e seu emprego não parece lá muito interessante. É quando ele recebe uma ligação de um antigo professor da faculdade, o convidando para um jantar onde seria homenageado já que está se aposentando. Jesse prontamente aceita o convite e seu retorno à pequena faculdade de artes no Ohio acaba trazendo aquela óbvia nostalgia de um tempo em que tudo parecia possível.

Com este plot parece que o público do filme Liberal Arts (dirigido por Josh Radnor) se restringiria a pessoas na mesma faixa etária do protagonista, mas o fato é que chegando em sua alma mater Jesse conhece (e se encanta por) Zibby, uma adolescente de dezenove anos que está justamente vivendo o período do qual ele sente tanta saudades. Zibby surge um  pouco como a representação de tudo que ficou em Ohio assim que ele se graduou, aquela avidez por novas experiências e ao mesmo tempo uma certa inocência sobre o que está por vir. Sim, ela também é uma manic pixie dream girl (aparentemente todo cara na casa dos trinta e poucos sonha com uma guria assim), mas vá lá, deixando de lado a birra pelo que já é um clichê do cinema atual, a personagem é até bem interessante, rendendo bons diálogos ao longo da história.

Aliás, Liberal Arts se sustenta principalmente em seus diálogos, já que o enredo em si é até meio bobo, convenhamos (se duvida do que estou dizendo, pense em Zac Efron vestido de riponga servindo como uma espécie de ‘padrinho mágico’ inclusive responsável pelo primeiro encontro de Zibby e Jesse a sós). Gosto inclusive como as figuras dos antigos professores são colocadas na vida de Jesse: se ele tem um conhecimento “avançado” do que Zibby viverá, seus dois professores “favoritos” também têm. Ao mesmo tempo que ele diz para Zibby ” I feel different now than I felt when I was here, and I hate to break this to you, but so will you“, Jess não consegue perceber que ele mesmo está no papel de “Zibby” quando questiona a professora Judith por toda sua amargura. No final das contas a melhor conclusão sobre o assunto é do professor Peter: “Nobody feels like an adult. It’s the world’s dirty secret.

Mas mais do que esta questão da idade, ou ainda, de se adequar à idade, o que mais gostei em Liberal Arts foram as referências literárias. Pela formação de Jesse (“I was English, with a minor in history, just to make sure I was fully unemployable.”) é claro que isso acabaria aparecendo, mas não imaginava que teria tantos bons momentos na história. Nem nomes nem títulos de autores são colocados de forma aberta, mas há uma série de dicas com as quais você consegue “adivinhar” de quem ele está falando (mesmo as capas dos livros ajudam).

O primeiro caso é Infinite Jest do David Foster Wallace. Enquanto espera por Zibby, Jesse acaba conhecendo um estudante chamado Dean. Ele está lendo um livro com uma capa cheia de nuvens, e quando Jesse comenta que ele adora aquele livro, Dean rebate com uma das melhores falas do filme: “Have you ever noticed how everyone around here speaks in wild hyperbole? Everything’s the best. Like, “He is the best professor ever”, or, “This is the best patty melt on the planet,” as if they’ve sampled every possible variety of professor and patty melt, which is, as we know, logistically impossible.”. É uma pena que a trama sobre Dean não tenha sido tão bem desenvolvida, era uma personagem que poderia render momentos ainda melhores. Mas o paralelo com DFW continua, na figura do jovem gênio atormentado.

Jesse: You know, he said the purpose of fiction was to combat loneliness.

Dean: That’s good. I never heard that.

Jesse: Yeah. Well, on the other hand, spending most of your time with an 1,100-page book tends to put a dent in your social life.

Dean: Yeah. Loneliness simultaneously increased and decreased.

O outro livro, por incrível que pareça, é Crepúsculo de Stephenie Meyer. Ao descobrir que Zibby leu um determinado livro sobre vampiros. Na capa dá para ver o título “Lunar Moon” (que fez com que eu lembrasse do Moon Moon, mas isso é outra história) e pela figura fica claro de qual obra estão falando ou ainda, o que ela representa ali: livros “mal escritos” que entraram nas listas de mais vendidos. Não concordo totalmente com a fala de Zibby quando eles discutem (especialmente com a parte de ficar quieto sobre o que se odeia), mas achei bacanas alguns argumentos dela ali e, mais ainda, a possibilidade de um filme trazer essa discussão (e não só um esqueminha “quem vai ficar com Jesse?”).

Isso para não falar de Ana, certeza que qualquer pessoa mais viciada em leitura vai imediatamente se reconhecerá nela. Então por mais que Liberal Arts seja apenas mediano, é um daqueles casos de filmes que “envelhecem bem” na lembrança, e vale a pena especialmente para quem, como Jesse, sente saudades de um lugar onde você pode dizer que é poeta sem ser zoado por isso. Pelo IMDb não tem data de estreia no Brasil, mas vocês sabem, hoje em dia o céu e o limite, há. Vai aí o trailer:

7 comentários em “Liberal Arts”

  1. Raquel Moritz – Blumenau, SC – Editora e publicitária blumenauense apaixonada por literatura. Anda sempre com um livro na bolsa e gosta de falar sobre seus livros e séries favoritas no Pipoca Musical.
    Raquel Moritz disse:

    Eu gostei bastante do filme. Dei risada com o Jesse e a Zibby discutindo o livro e adorei a nostalgia dele com o tempo de estudante. Acho que valeu o tempo. Além do mais, a fotografia do filme é bem bacana :}

    Beijo!

    1. Eu me identifiquei muito com essa nostalgia. Dia desses passei pela Reitoria e quase fiz como ele naquela cena que ele se joga no gramado, sabe? >

      1. Raquel Moritz – Blumenau, SC – Editora e publicitária blumenauense apaixonada por literatura. Anda sempre com um livro na bolsa e gosta de falar sobre seus livros e séries favoritas no Pipoca Musical.
        Raquel Moritz disse:

        Hahahahaha, ia ser legal 😛

  2. Assisti esse há um tempinho e adorei. E sabe quando um filme envelhece bem, dá um sensação boa quando se lembra dele? Pois é.
    Gostei de como o final me surpreendeu (a troca de cartas, etc). Ah, e a discussão sobre “Crepúsculo” é ótima. Fico curiosa sobre a recepção do filme, porque me parece que ele exige um público bem específico, né?
    A propósito, o outro filme que o Ted Mosby dirigiu, Happythankyoumoreplease, também é legal.

    1. Bem isso, envelhece bem =D Eu gostei do final porque ele deu uma sensação de que o Jess finalmente se dá conta de que envelhecer (ou ser adulto, digamos assim) não significa deixar de ter planos ou sonhar (por causa daquela conversa dele com a Ana). É até bem sutil, acho que algumas pessoas vão ficar meio “Heeeim? Acabou?” hehe

      Eu quase baixei o Happythankyoumoreplease, mas deixei esse primeiro porque sabia que iria me identificar mais heheh

  3. Vi a pouco e gostei tb!
    Fiquei feliz que por aqui achei o nome do livro de capa de nuvens.
    Mas fiquei curiosa em saber o nome do livro das ultimas páginas devastadoras que o Jesse sempre pega pra ler na livraria. Pena o filme nao disponizar, né?

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