Foco (Arthur Miller)

O romance Foco, escrito por Arthur Miller, foi publicado em 1945, antes das grandes peças que o consagraram como Morte de um Caixeiro Viajante e As Bruxas de Salém. Mas quem espera um trabalho mais ingênuo, ou até mesmo mais fraco com o livro (lançado recentemente com nova tradução pela Companhia das Letras), pode ter certeza que não é o caso. A semente do que se verá em seus trabalhos mais conhecidos já está plantada ali, criando não só um retrato cru e verdadeiro dos Estados Unidos daquele tempo, mas também no desenvolvimento de personagens inesquecíveis, seja pelo que têm de melhor ou de pior – porque as figuras de Miller são assim, imperfeitas, e por isso mesmo tão cativantes.

Veja o caso de Foco. O protagonista, Lawrence Newman, é apresentado para o leitor como uma pessoa horrorosa: ouvindo os gritos pedindo socorro de uma garota na rua, ele resolve ficar quieto. E não é nem por covardia, é simplesmente porque acha que se chamasse a polícia, quando ela chegasse o assunto já estaria resolvido e ele acabaria tendo que explicar a situação para os policiais. No outro dia a coisa piora ainda mais, quando em conversa com um vizinho no caminho para o trabalho, esse conta que era “só uma latina” e que ajudou o amigo bêbado que cometia a agressão a voltar pra casa – Newman nada diz sobre isso, não repreende o vizinho como esperamos que uma personagem “boazinha” faça. E aos poucos vamos vendo como ele é preconceituoso, decidindo quem ganha ou não emprego na empresa em que trabalha baseado no juízo que ele faz da aparência da pessoa. Se parece com um judeu, por exemplo, o emprego está fora de questão. Continue lendo “Foco (Arthur Miller)”

A morte de um caixeiro viajante e outras 4 peças de Arthur Miller

Falar que Arthur Miller é um dos maiores nomes da dramaturgia norte-americana é até um lugar comum. Não há quem goste de teatro e em algum momento não tenha cruzado com algum texto seu, sendo que o encontro se dá normalmente com duas de suas obras mais famosas, A morte de um caixeiro viajante (Death of a Salesman) e As bruxas de Salém (The Crucible). A força de seu texto está principalmente no retrato fiel de uma época, o pós-guerra nos Estados Unidos, que tão fortemente moldou a sociedade daquela época, seja com valores como o do “sonho americano” como com a histeria do anti-comunismo.

Miller era um crítico ácido e astuto, e em suas peças em determinados momentos até bastante sutil. Do recorte de um dia comum na vida de pessoas ordinárias é possível tirar tanto que chega a ser injusto reduzir a importância de sua obra só à literatura norte-americana: ele fala de homens, tão reais, tão tridimensionais que poderiam estar falando de suas tristezas, paixões, medos e sonhos em qualquer lugar do mundo. É o que se pode perceber na coletânea A morte de um caixeiro viajante e outras 4 peças de Arthur Miller, lançada pela Companhia das Letras com tradução de José Rubens Siqueira.

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O cobertor de Jane (Arthur Miller)

Dia desses encontrei uma lista com sete livros infantis de autores de literatura adulta, e me surpreendi com alguns títulos. Você sabia que James Joyce escreveu um livro para crianças? Eu não. E foi com a mesma surpresa que vi o lançamento que saiu este mês pelo selo Companhia das Letrinhas,O cobertor de Jane. Escrito por ninguém mais, ninguém menos do que Arthur Miller, o mesmo autor de As Bruxas de Salem e A Morte do Caixeiro Viajante.

A história é bastante singela, falando principalmente sobre o crescimento, de como envelhecer significa também deixar certas coisas para trás. Jane tem um cobertorzinho cor-de-rosa (que chama de “betô”) desde bebê, e a medida que vai crescendo o cobertor fica cada vez mais pequeno para ela. São várias as vezes que ela quase o abandona, mas acaba buscando o “betô” novamente – até que chega a hora da separação definitiva.

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