Perdido em Marte (Andy Weir)

perdidoO plano era ter lido o livro antes de chegar ao cinema, mas acabei me enrolando. Por causa da temporada de premiação, acabei assistindo Perdido em Marte antes de ler o livro de Andy Weir, que saiu em outubro de 2014 aqui no Brasil pela Arqueiro com o subtítulo: Uma Missão a Marte. Um Terrível Acidente. A Luta de Um Homem Pela Sobrevivência. Não, sério. Vai ver ali na Amazon. Só faltava a conclusão do livro no subtítulo hehe. Mas ok, pelo que eu entendi parece que depois na edição capa de filme virou só Perdido em Marte de novo. Tá, foco, vamos voltar ao ponto inicial: eu vi o filme antes de ler o livro.

E eu adorei a adaptação, demais mesmo. Matt Damon está ótimo como Mark Watney e vá lá, eu tenho um fraco por filmes que tenham cenas com David Bowie tocando no fundo. Só que por mais que a curiosidade pelo livro tivesse aumentado, ficou maior também aquele receio de que não valeria a pena ler, já que eu tinha lá a impressão inicial de que muito do charme da história se sustentava na resposta para a pergunta “Ele volta ou não para a Terra?” (e se você viu o filme, você sabe a resposta, eu é que não vou contar aqui).

Ok, o fato é que não, não é saber se Mark volta para casa que prende nossa atenção ao longo da leitura (ahá, aposto que você tomou um susto achando que eu contei o fim. Vou tentar um post spoiler-free, prometo). A grande sacada de Perdido em Marte é que voltar para a Terra é um entre outros tantos desafios que ele terá que enfrentar para sobreviver a partir do momento em que um acidente o separou de sua equipe de pesquisa em Marte. Cheguei a ler algumas críticas que apontam como um dos defeitos do livro, porque a estrutura acaba se tornando repetitiva: desafio, superação, desafio, superação. Sabe, é como se você estivesse jogando Super Mario, derrotasse o chefe da fase e aí…

Mas eu não consigo concordar com essa opinião. Porque veja bem, o cara não está sozinho em uma ilha deserta, é um planeta diferente, meu amigo. Até o ar é um problema. Então é óbvio que a estrutura seguirá dessa forma, porque não seria possível esperar outra coisa de um sujeito sozinho em Marte do que um monte de desafios a serem superados até o momento em que ele pudesse voltar para a Terra.

E mesmo a repetição da estrutura não chegou a me incomodar porque Mark Watney é uma das melhores personagens-narradoras que li recentemente. Sério, o cara é muito divertido. Um nerdão muito divertido, o que significa um monte de referências à cultura pop para pescar (de minha parte confesso que o “Damn it, Jim, I’m a botanist, not a chemist!” da página 36 foi o que me conquistou de vez e fez com que eu continuasse a leitura).

Watney é aquele caso típico de pessoa que recorre ao humor em um momento difícil. Tenho certeza que você deve conhecer alguém assim – enquanto muitos surtam, ficam estáticos ou xingam muito, outros transformam tudo em piada. Esse é Watney (e, até por causa disso, as últimas frases do livro não poderiam ser mais apropriadas).

E no final das contas como leitores de seus diários nós somos os interlocutores, é conosco que Watney conversa – o que acaba ajudando a criar situações de humor como quando ele está explicando mais uma das MacGyverzices dele:

It seemed to work well. The seal looked strong and the resin was rock-hard. I did, however, glue my hand to the helmet.

Stop laughing.

E na hora eu ri tanto imaginando o sujeito com a mão colada no capacete que ler aquele “pare de rir” fez com que eu risse ainda mais. Tem umas outras passagens em que ele fala com quem está lendo que também criam essa situação de humor, mas acho que essa foi uma das melhores.

Mas o livro não conta apenas com os registros (e portanto, a narração) de Watney, mas também comum narrador em terceira pessoa que descreve como a NASA está trabalhando para trazer Mark para casa. Você poderia imaginar que esse narrador que segue uma linha neutra acabaria sendo chato comparado com a voz do astronauta, o negócio é que Weir faz aí um jogo com as duas vozes que acabam criando situações como essa mescla o narrador contando os pensamentos de Teddy (diretor da NASA) com um registro do diário de Mark:

“What must it be like?”, he pondered. “He’s stuck out there. He thinks he’s totally alone and that we gave up on him. What kind of effect does that have on a man’s psychology?”

He turned back to Venkat. “I wonder what he’s thinking right now.”

LOG ENTRY: SOL 61

How come Aquaman can control whales? They’re mammals! Makes no sense.

E não pense que todo esse humor acaba com a tensão. As páginas finais eu ia virando rapidamente, mesmo sabendo qual seria o desfecho. Não é uma mera questão de dificuldades impostas, é também o ritmo, o modo como salta dos registros de Watney para as pessoas que estão tentando salvá-lo.

Não é uma releitura de histórias de “ilha deserta”, até porque Weir segue para outro lado. É diversão mesmo, do começo ao fim, sem se propor a usar a figura do homem isolado como pano de fundo para ideias sobre humanidade, sobrevivência ou solidão. Não que Watney não vá falar sobre isso em algum ponto. É mais que a proposta de Weir é bastante óbvia: divertir.

O que ele faz muito bem do começo ao fim. Mesmo nos trechos em que seu narrador-personagem entra em detalhes técnicos que poderiam ser um tanto entediantes (desculpa, sou de humanas), ainda assim ele consegue prender a atenção do leitor e diverti-lo através da voz de Watney. E de fato, ter assistido ao filme antes não estragou em nada a leitura: mesmo sabendo o desfecho, eu segui em frente não só pelas diferenças (posso estar enganada mas a tempestade de poeira ficou fora do filme, não?), mas porque não dá para abandonar um cara como o Watney.

It’s true, you know. In space, no one can hear you scream like a little girl.

***

Eu li um e-book americano comprado na Amazon e ele não tinha mapa nem nada. Pelo que eu vi, a edição da Arqueiro parece ter um mapa mostrando o caminho percorrido pelo Watney em Marte. Para quem tem a mesma edição fuéééém sem mapa que eu tenho, é só clicar aqui para um mapinha (tirado lá da wiki). Ou não. Acho que consegui escrever um post sem spoiler mas a imagem pode ter um spoiler?

2 comentários em “Perdido em Marte (Andy Weir)”

  1. Ai, Anica! Fiquei encantadíssima com filme e por isso acabei descobrindo a respeito do livro. Se já gostei do filme, imagino como não será o meu amor pelo livro 🙂

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