A Gangue do Pensamento (Tibor Fischer)

Pense em um livro que em dado momento tem o seguinte parágrafo:

“Há um momento na vida em que se precisa sair de um carro que contém um criminoso imperdível, e, trajando um uniforme zunindo de ridículo, entrar à força num empório de azeitonas, numa tentativa de resgatar um assaltante à mão armada maneta, e tombar morto a tiros.”

A citação acima é do livro A Gangue do Pensamento, do escritor britânico Tibor Fischer, e representa muito bem o que o leitor terá em mãos ao começar a ler o romance. Não é um livro comum em diversos sentidos. Mas a insanidade da trama é certamente para poucos até porque Fischer não é sutil: quem pensa que o trecho citado é um momento máximo da loucura da história, é bom já saber que desde o começo é assim.

Pessoalmente não vejo isso como um ponto negativo, pelo contrário, me diverte e prende muito a atenção. É um pouco mais exagerado do que na coletânea de contos Adoro Morrer, mas tal como nesse livro também lembra muito aos filmes de Guy Ritchie (como Snatch ou Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes). O que é bom na prosa de Fischer é que mesmo em um universo completamente caótico, com uma narrativa em que o tempo parece uma colcha de retalhos com um punhado de flashbacks mesclados ao tempo presente da história, ainda assim ele consegue trazer tanto, mas tanto para se pensar.

A Gangue do Pensamento começa com Eddie Caixão, um professor de filosofia que acaba acordando um dia em uma situação para lá de inusitada (deixo para você a surpresa de descobri-la ao ler) e acaba sendo preso pela polícia. Depois, ele foge para a França, onde começa uma série de assaltos a banco com Hubert, sujeito que tentara o assaltar e descobriu que bem, Eddie era um sujeito sem um tostão furado. Os assaltos acabam virando uma gigantesca bola de neve, criando inclusive o nome da dupla que é o título do livro.

Mas se você acha que um enredo assim já vale por si só a leitura do livro, saiba que Fischer tem muito mais na manga. A narrativa em primeira pessoa, sob o ponto de vista de Eddie Caixão é simplesmente genial. A mania do filósofo em ir separando tudo o que está dizendo em a) listas e b) divididas exatamente assim é muito engraçada. O texto por um lado é pesado porque é realmente difícil acompanhar o fôlego da história, por outro é leve justamente por causa da acidez com a qual Caixão vê a si mesmo e a todos, somado ao tom de conversa informal que o narrador apresenta.

É, de fato, um livro de humor extremamente corrosivo. Entre um assalto e outro os mais diversos assuntos são levantados, e quando digo diversos é porque realmente são muitos. Caixão resgata relacionamentos do passado, fala de dinheiro, da vida profissional, da juventude, de tudo. E é aí que Fischer te conquista para sempre, aquelas frases espirituosas que você adoraria ter pensado ou escrito, que dão vontade de ir grifando o livro inteiro.

Acredite, A Gangue do Pensamento não é exatamente um livro fácil (não querendo estragar surpresas, só digo uma coisa: que conclusão foi aquela?!!), mas chegando ao final da leitura você percebe que valeu muito a pena. Seja pela diversão, seja pelo tanto que deu para pensar. E claro, bate aquela boa e velha vontade de ir atrás de outros títulos do autor.

2 comentários em “A Gangue do Pensamento (Tibor Fischer)”

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