Putas Assassinas (Roberto Bolaño)

Publicado no Brasil pela Companhia das Letras pela primeira vez em 2008, e agora em 2010 ganhando a primeira reimpressão, Putas Assassinas trata-se de uma coletânea de contos do escritor chileno Roberto Bolaño. Eu confesso que ainda estou começando a conhecer o autor (lendo 2666 aos poucos, lembram?) e fiquei bastante impressionada com o que vi, ainda mais quando os fãs de Bolaño dizem que esse é o livro mais fraco dele. Se realmente é, fico imaginando os demais deve ser excelente.

Não é que todos os contos sejam perfeitos. Mas todos chamam a atenção por algum aspecto, mesmo os que se revelam mais sem graça. Os temas são recorrentes (e inclusive ecoam no romance 2666): sexo, violência, exílio, pesadelo. A maioria das personagens mostram aquele deslocamento de quem vive em vários lugares mas não reconhece nenhum como seu. São de outros países, vão para outros países e se perdem, tentando se encontrar em resgates de memória.

O mais interessante é o que ele faz com o gênero. Não escondo que sou da escolinha Allan Poe de apreciação desse tipo de texto: acho que é quase como o haikai da prosa, e ganha quem consegue dizer muito com pouco. Mais além, acredito que um efeito só é causado no leitor se houver concisão. Mas Bolaño segue o caminho oposto e se dá muito bem. É quase como se pintasse um quadro e incluísse detalhes mínimos, visíveis apenas para quem se aproxima da tela. Informações que parecem irrelevantes se fundem ao texto e complementam os sentimentos e dúvidas das personagens, dão vida ao espaço e muitas vezes – surpresa – fluidez à narrativa.

O retorno é de longe o meu favorito, talvez por ser o que mais bem-humorado. É ler as primeiras linhas do conto para já ser conquistado: “Tenho uma notícia boa e uma má. A boa é que existe vida (ou algo parecido) depois da vida. A má é que Jean-Claude Villeneuve é necrófilo.” Ou quando quase no fim de Dias de 1978 diz “Esse relato deveria acabar aqui, mas a vida é um pouco mais dura que a literatura.” São passagens que continuam com você mesmo após fechar o livro.

Chama a atenção também como ele consegue tirar mais do ato de narrar, como faz no conto que dá título ao livro. Em Putas Assassinas temos o registro da fala de uma mulher, e as respostas do homem são descrições de suas ações. Funcionou muito bem porque inicialmente você apenas deduz o que está acontecendo, para em determinado momento, as ações deixam óbvio, e aí a fala da personagem confirma o que você previu. Muito interessante mesmo.

Outra questão são os aspectos autobiográficos. Eu acabei caindo em tentação e fui atrás de um pouco mais da biografia de Bolaño enquanto lia Putas Assassinas, e em alguns contos elementos da vida do autor ficam bem evidentes, como o pai que era um ex-pugilista e aparece no excelente Últimos entardeceres na terra. Pode ser que Bolaño tenha colocado pistas falsas no texto, mas não dá para não estabelecer essas relações, sobretudo quando a personagem assume um kafkniano “B” como nome.

Assim, dá para dizer que mesmo que com alguns momentos não tão bons, no geral os contos são excelentes, fazendo de Putas Assassinas uma ótima leitura. Foi também muito bom conhecer o lado contista de Bolaño. E volto a insistir: se esse é o trabalho mais fraco dele, preciso urgentemente ler mais dele.

Putas Assassinas
Roberto Bolaño
Tradução: Eduardo Brandão
224 páginas
Preço sugerido: R$ 39,50