O Seminarista (Rubem Fonseca)

Lançado no mês passado, O Seminarista de Rubem Fonseca vem marcado com importantes estreias. No campo do mercado editorial, é a primeira obra inédita de Fonseca publicada pela editora Agir (depois de 20 anos no catálogo da Companhia das Letras). E considerando a tecnologia, foi o primeiro livro lançado também em formato eletrônico, para ser lido no Kindle. E embora a novidade inicialmente não tenha dado muito certo (o e-book estava custando mais caro que a versão impressa desse), isso não tem nada a ver com a qualidade do livro, não é mesmo?

Somando isso a uma campanha de marketing muito bacana que inclui até um video com ninguém mais ninguém menos do que o próprio Fonseca narrando o começo do livro, fica difícil segurar a curiosidade e esperar para conferir o que o autor de obras como Lúcia McCartney (1967), O caso Morel (1973) e Agosto (1990) trouxe de novo para os leitores.

O Seminarista é narrado por José, ex-seminarista e matador de aluguel que acaba de decidir que se aposentará. Não fosse todo em primeira pessoa, muito da graça do livro se perderia. São as reações e comentários de José enquanto executa seu trabalho que rendem ótimos momentos de um humor negro (e às vezes até nonsense), como quando já pela metade da história informam que uma personagem está envolvida com contrabando, e ele pensa “Caramba, só tem gente safada nesse país”.

José é uma ótima personagem, daquele jeito torto que só anti-herói consegue ser. É rabugento, paranóico, adora rock e literatura, vive citando frases em latim e sabe que o que faz não está exatamente do lado certo do espectro da moral. Chega a ser irônico que exatamente quando decide se aposentar, ele é novamente tragado para o submundo do crime, só que dessa vez como a presa, e não o caçador. De certa forma lembra um pouco os movimentos de Michael Corleone (interpretado por Al Pacino) em O Poderoso Chefão III, quando ele tenta se afastar da máfia: bem quando eu achava que estava fora, eles me arrastam de volta.

O mistério que o livro propõe (quem quer ver José morto) não chega a ser muito difícil de desvendar, a questão fica mais por conta dos motivos e mesmo de que forma as personagens se ligam – e isso Fonseca dá conta muito bem. Na realidade, acredito que a resposta para o “Quem?” é fácil porque somos induzidos por José a desconfiar de todo mundo (tem personagem que mesmo depois de morta você ainda acha que tinha alguma culpa!).

No geral, deve agradar não só aos leitores de romances policiais, porque a leitura em si é fluida, gostosa. É daquele tipo de livro que você devora em um dia sem nem se dar conta. Se ficou curioso, tem o primeiro capítulo disponível no site de O Seminarista. E também aproveite para conferir o excelente artigo publicado na Bravo! sobre o autor e a obra.

Sobre a obra:

O Seminarista. Editora Agir, 184 págs., R$ 36,90 (inclui a edição ilustrada do conto A Arte de Andar pelas Ruas do Rio de Janeiro).

(Originalmente publicado no blog Meia Palavra em 16/12/09. Eu não estou mais tão relapsa, mas queria deixar esse registrado aqui no Hellfire também)

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