The Love Affairs of Nathaniel P. (Adelle Waldman)

loveaffairsOk, está aí um livro estranho. Eu já devo ter falado por aqui mais de uma vez de protagonistas tão chatos que acaba que eu simplesmente não me importo com o desenrolar da história, certo? Mas não consigo lembrar (pelo menos não agora às 8 da manhã, há!) de alguma vez ter odiado TANTO um protagonista e mesmo assim ter gostado TANTO de um livro. Vontade de vê-lo se ferrando no fim? Masoquismo? Não sei. Só sei que The Love Affairs of Nathaniel P., livro de estreia de Adelle Waldman, foi realmente uma experiência interessante.

Como já deve ter dado para imaginar, o protagonista detestável em questão é o tal do Nathaniel P., que daqui para frente chamarei de Nate porque é como o narrador se refere a ele. Enfim, Nate é um carinha que vive de escrever artigos para periódicos como freelancer, até que finalmente consegue um contrato com uma editora para lançar um livro. É a glória, no mundinho intelectual de Nova York retratado por Waldman – é mais do que um cartão de visitas, é o que te torna alguém. Ao ponto de você usar seus contratos como escala para se comparar com alguém: “Greer had sold her book for more money than he’d sold his, and would probably sell more copies, but as a memoirist of adolescent promiscuity, she lacked a certain… respectability.“. Enfim, acho que dá para entender o efeito que esse contrato tem: o carinha que era o zé-ninguém de repente entra na mira da mulherada.

E veja bem, é quando Nate começa a achar que as mulheres se sentem atraídas por esse “escritor a ser publicado” que dispara o alerta contra cuzão. É, não tem outro termo para descrever Nate. Ele é um cuzão. Enquanto a história ia tomando forma – nitidamente concentrada na relação dele e de uma garota que ele conhece em uma festa- até pensei “Ahh, a autora está fazendo tipo um 500 days of Summer, só que ao invés de ‘a’ Summer é ‘o’ Summer.” Mas olha, eu que nunca consegui defender as atitudes da Summer comecei a compreendê-la e ver no que ela se diferencia de um cuzão como o Nate.

O truque da Waldman aqui é o uso do narrador onisciente em terceira pessoa, é claro. Ele descreve os pensamentos de Nate sem julgá-los, deixando o julgamento para o leitor. Inicialmente você acompanha o modo como a personagem reagiu a uma gravidez indesejada com um certo pé atrás (“Ok, ele foi um cara decente, mas bem que poderia ter ligado depois”, etc), mas pouco a pouco o narrador vai colocando mais e mais desses pensamentos e você vai percebendo quem ele é de fato. Tive momentos de SEU CRETINO FILHO DA PUTA, sério mesmo. Hannah manda um email discutindo um assunto com ele, o que ele pensa? “Ah, ela quer dar para mim”. E isso é só o começo.

Talvez o que torne tudo tão difícil é o fato de Hannah ser uma guria tão inteligente, e tão consciente da roubada em que está se metendo. Aliás, tudo que você odeia de Nate, você provavelmente gosta de Hannah. Ela é o tipo de guria com quem você travaria o seguinte diálogo (citação longa, mas necessária, blé!):

Nate: It’s hard not to feel irrelevant in a world where a book that does really well sells maybe a hundred thousand copies. Even the lamest television show about time travel or killer pets would be canceled instantly if it did that badly.

Hannah: Oh, I don’t know. I think it’s vanity to want it both ways. You know, to want to write books because that’s your thing but also to want to be treated like a rock star.

Nate: are you really so indifferent to the fate of books? You said the other night you love Nobokov. Wouldn’t it be a bad thing people stopped reading Lolita?

Hannah: I think people who are likely to appreciate Lolita will read Lolita. I don’t care about the rest. I mean, I don’t care what they do for fun.”

Nate: You’re saying that most people are philistines and no amount of education or cultural outreach will change that?

Hannah: Not exactly. I mean, who says ‘philistine’ anymore?

Nate: You know what I mean.

Hannah: I don’t think they are worse people because they don’t like novels, if that’s what you mean.

Nate: You don’t?

Hannah: They could be, I don’t know, scientific geniuses or Christians who devote their lives to charity. I don’t see why being a person who reads novels makes me or anyone else superior.

Aliás, parte do charme do livro são justamente os diálogos – não só entre Nate e Hannah, mas os amigos de Nate como Jason e Aurit também rendem ótimos momentos. Mas voltando à Hannah: a guria é inteligente, independente, aquela coisa toda. Então é natural que ela se sinta atraída por um cara igualmente inteligente. O problema é que quando o relacionamento entra em crise e Nate começa a se afundar em pensamentos como “It was not always unpleasant to deal with a hysterical woman. One feels thoroughly righteous in comparison“, Hannah está lá, sem entender o que está acontecendo para que algo tão bom pudesse se transformar naquilo, e completamente dividida entre fazer o que ela sabe que tem que fazer (chutar a bunda do cara para bem longe) e o medo de perder alguém com quem ela parecia ter estabelecido uma relação tão especial. Nesses momentos em que Hannah tentava colocar em palavras para Nate o que sentia, eu lembrava imediatamente de uma imagem que vi uma vez no tumblr, essa aqui:

Porque embora Nate insista com a amiga Aurit que o sucesso do outro relacionamento se deu por causa do “momento certo”, Aurit parece pensar diferente. É a pessoa certa. Nate e seu ego do tamanho de um bonde não admitiria jamais em sua vida uma mulher que fosse igual (ou até superior) a ele, intelectualmente (e emocionalmente) falando.

Enfim, por causa principalmente de Nate e de suas ações o livro é tão estranho. Logo que terminei fui sondar opiniões no goodreads (isso está virando um hábito), e o que eu reparei com alguma surpresa é que na maior parte das vezes as notas ruins foram atribuídas por mulheres, e as notas boas por homens, com comentários dizendo o quão assustador é uma mulher conseguir falar de homens como a Waldman faz. Estranho, não? Fico pensando se as mulheres que leram e não gostaram esperavam uma história mais próxima de uma realidade água com açúcar de chick-lit (e ei, eu leio chick-lit, não estou criticando) e aí não gostaram da acidez do livro. Até porque se formos pensar friamente, nossa vida amorosa é uma coleção de histórias que não deram certo, chegando até a que finalmente dá. O que a autora faz é contar uma das que não deram certo, ao invés de ir atrás da que tem o viveram felizes para sempre.

Dating is probably the most fraught human interaction there is. You’re sizing people up to see if they are worth your time and attention, and they are doing the same to you. It’s meritocracy applied to personal life, but there’s no accountability. We submit ourselves to these intimate inspections and simultaneously inflict them on other and try to keep our psyches intact – to keep from becoming cold and callous – and we hope that the end of it wind up happier than our grandparents, who didn’t spend this vast period of their lives, these prime years, so thoroughly alone, coldly and explicity anatomized again and again. But who cares, right? It’s just girl stuff.

Para quem se interessou: o livro saiu ano passado lá fora, e pelo que eu sondei ainda não chegou por aqui. Acabei de ficar sabendo que a autora escreveu uma espécie de prequel de 45 páginas, mostrando o Nate sob o ponto de vista de Aurit, parece interessante.

ATUALIZADO (09/09/2015): O livro saiu aqui no Brasil pela Casa da Palavra (Leya) como Os Casos de Amor de Nathaniel P.

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